sábado, 11 de dezembro de 2010

O Mágico da Cantina




Para quem não me conhece, eu sou bastante preguiçoso.
Nada invoca em mim maior preguiça do que cozinhar, por isso, vejo-me obrigado a procurar diariamente algum sítio para jantar.
Numa altura em que o dinheiro anda escasso nos bolsos de toda a gente, um jantar (sopa, mais prato de peixe ou carne, mais sobremesa, mais sumo) a dois euros e vinte cêntimos na cantina da universidade, é uma opção bastante apelativa.
Pena é só ser a ideia, pois a comida é tudo menos apelativa. Palavras como estranha, alienígena, praticamente intragável são as primeiras que me vêm à cabeça.

Numa dessas noites em que jantava com um grupo de amigos, um pobre coitado que jantava lá pela primeira vez, veio-se juntar a nós. Chamava-se Miguel, mas também podia se chamar André – hmmm – Júlio é que não era – de certeza. Um rapaz juntou-se a nós, muito falador, amistoso e tudo o resto, parecia que já nos conhecia há imenso tempo.
No meio da conversa acabou por revelar que era um mágico e provou-o fazendo um truque de prestidigitação com uma moeda que nos pediu emprestada. O resto do jantar foi servido com conversas e explicações sobre truques e estratagemas do mundo da magia e cada um de nós falou também dos seus truques preferidos que tínhamos visto.
Entre uma e outra garfada de comida, éramos presenteados com mais um truque do nosso amigo.
“O verdadeiro truque é ser discreto e desviar a atenção.” De certeza que não foram bem estas as palavras que disse, mas foi a ideia que deixou.



Estávamos todos muito divertidos quando a cozinheira nos aconselhou, com toda a delicadeza dum agente da Gestapo a falar com um judeu negro, que era melhor sairmos. O nosso amigo mágico prontamente voltou a endireitar a colher que tinha dobrado com a mente. Ok. Dobrou a colher com a mente e endireitou-a com as mãos.
Já lá fora, não demorámos muito a conversa, tínhamos todos sítios diferentes onde estar.
O nosso amigo mágico disse-nos que gostava muito de Lisboa. Ele não era de cá, estava só de passagem.
“Tem uma luz fantástica.” Foi o que comentou ao sacar duma máquina fotográfica para capturar um prédio todo aceso, na descida para a fonte luminosa.
Depois deste momento despedimo-nos todos, ele desceu a rua, os meus amigos viraram à direita e eu voltei para trás.

Nunca mais o voltei a ver.
A comida da cantina naquela noite soube excepcionalmente melhor. Deve ter sido um dos muitos truques do nosso amigo.


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